O Ministério Público Federal ingressou nesta terça-feira (8) com Ação Civil Pública na Justiça para que o Ministério da Educação realize Consulta Pública sobre o programa Future-se, obedecendo as regras próprias estabelecidas pela legislação na área.
A petição tem como objetivo assegurar que a sociedade seja correta e devidamente consultada, na forma da lei, sobre a proposta que busca alterar o modo de financiamento do Ensino Superior público no Brasil ao ampliar o papel das verbas privadas no orçamento das universidades – tema que afeta a autonomia constitucional dessas instituições.
Embora o processo de Consulta Pública conte com legislação específica e que estabelece normas quanto à elaboração, redação, alteração, consolidação e encaminhamento de propostas recebidas, o procedimento realizado pelo Ministério da Educação sobre o Future-se não cumpriu minimamente os requisitos legais na área.
Na petição, o Ministério Público Federal aponta irregularidades que vão desde a ausência de ampla e prévia divulgação do documento convocatório, à falta de disponibilização dos documentos em linguagem simples e objetiva, bem como dos estudos e do material técnico que fundamentaram a proposta. O MPF também ressalta que a Consulta foi realizada por uma organização social, sem contrato estabelecido, embora a legislação determine que consultas públicas sejam efetuadas, em todas as suas etapas, pelo Poder Público.
“Para que cumpra sua função, a consulta possui forma determinada, definida por meio do Decreto nº 9.191/2017 e do Decreto-Lei nº 4.657/42. Tais providências objetivam, naturalmente, assegurar a idoneidade da consulta pública, tendo em vista o fator de legitimação que a manifestação popular confere a determinada proposta legislativa. Ocorre que tais providências não foram adotadas no presente caso”, destaca o Ministério Público Federal.
Embora tenha sido anunciada publicamente pelo Ministério da Educação como Consulta Pública, a pasta passou a nomear o procedimento como “pré-consulta” ou “pesquisa” após as irregularidades terem sido questionadas pelo Ministério Público Federal.
“Em agosto, o MPF chegou a solicitar informações ao MEC quanto ao descumprimento do que estabelece a legislação na área, mas a pasta limitou-se a justificar as irregularidades com a fundamentação de que não se tratava de Consulta Pública, mas de pré-consulta. A afirmação contraria as próprias notas técnicas encaminhadas pelo Ministério e que foram elaboradas por sua Secretaria de Educação Superior e pela Advocacia-Geral da União”.
O texto da petição destaca que não socorre à administração, ao ser questionada sobre a observância das regras do Decreto nº 9.191/2017, a tentativa de alterar a natureza da consulta realizada, passando a denominá-la de pré-consulta ou pesquisa – seja pelo fato de que o que foi convocado publicamente foi consulta, seja por inexistir previsão de pré-consulta nos regramentos do Decreto nº 9.191/2017.
No documento, o Ministério Público Federal ressalta que a ação judicial não pretende impor a realização de consulta pública sobre o Future-se – decisão que já foi tomada pelo Ministério da Educação e que estava dentro da margem de deliberação do órgão.
“Todavia, não estava e não está dentro da margem de deliberação do MEC a realização de Consulta sem observância das normas legais e regulamentares específicas. Vale dizer que, uma vez decidida a realização de Consulta, a discricionariedade da administração se interrompe, devendo então seguir os preceitos legais e regulamentares pertinentes”.
Suspensão da Portaria nº 1.701/2019
Na ação apresentada à Justiça, o Ministério Público Federal também pede que sejam liminarmente suspensos os efeitos da Portaria nº 1.701, publicada pelo Ministério da Educação em 30 de setembro. O ato normativo institui um Grupo de Especialistas Jurídicos que teria como objetivo “consolidar as propostas apresentadas por meio da pré-consulta aberta à comunidade sobre o Programa Future-se e elaborar proposição legislativa acerca do referido Programa, a ser encaminhada ao Congresso Nacional”.
A publicação da portaria se deu em contrariedade ao que defende a própria Nota Técnica elaborada pela AGU, e encaminhada pelo MEC como resposta aos questionamentos feitos pelo MPF.
No documento, a Advocacia-Geral da União indicou que, após a etapa nomeada como “pré-pesquisa”, haveria a subsequente realização de uma Consulta Pública na forma do que estabelece o Decreto 9.191/2017. No documento, o Ministério Público Federal aponta, portanto, que o caminho a ser adotado pelo Ministério da Educação será o de encaminhar ao Congresso Nacional as propostas sobre o Future-se colhidas a partir de consulta pública realizada de maneira irregular, e chama atenção para o fato de que o prazo anunciado pela pasta para conclusão dos trabalhos é de apenas 15 dias.
A ação civil pública é assinada pelo procurador regional dos Direitos do Cidadão no Rio Grande do Sul, Enrico Rodrigues de Freitas.