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O filme “Minha Mãe é uma Peça 3” e o direito dos LGBTs

Debora Ghelman é advogada especializada em Direito Humanizado nas áreas de Família e Sucessões, atuando na mediação de conflitos familiares a partir da Teoria dos Jogos

Debora Ghelman. Foto: Fred Busch

O filme “Minha mãe é uma peça 3” retrata com bastante humor e originalidade o relacionamento de uma mãe com seus filhos adultos. Essa mãe se chama Dona Hermínia e é interpretada pelo ator Paulo Gustavo, que também é o roteirista do filme. Paulo Gustavo inspirou-se em sua mãe para interpretar a personagem, que possui um amor incondicional por seus filhos. Mas, como ninguém é perfeito, essa mãe acaba invadindo demais a vida pessoal de seus filhos, chegando ao ponto de ouvir de sua filha que agora ela não faz mais parte de seu núcleo familiar.

Dona Hermínia fica magoada com seus filhos, sente-se rejeitada, simula um grave problema de saúde e chega ao ponto de ser internada num hospital justamente para receber a visita de seus filhos que tanto ama. Sim, a internação foi um pretexto para estar junto de seus filhos e qual foi a sua surpresa ao descobrir duas novidades: sua filha está grávida e o seu filho gay irá se casar com seu namorado.

É emocionante ver como Dona Hermínia trata com bastante naturalidade o casamento de seu filho homossexual. Ela aceita a orientação sexual de seu filho. Essa atitude acolhedora de Dona Hermínia conquista todos aqueles que estão assistindo ao filme. Dona Hermínia age como uma típica mãe que irá casar seu filho: pensa nos preparativos do casamento, começa a palpitar em tudo, até que chega o momento em que é apresentada à futura sogra de seu filho. Aí começa a cômica competição entre as sogras. No dia da cerimônia brigam, estragam o bolo, depois fazem um novo bolo mas, no final, tudo dá certo. Enfim, o casamento é celebrado!

Ao final da cerimônia, Dona Hermínia é homenageada por seu filho: “Ela disse que não tinha nenhum problema ser gay, que o problema é lá fora, com o que as pessoas poderiam fazer comigo. Ela me apoiou e ajudou a ter confiança e coragem. Mas eu sei que, infelizmente, essa não é a realidade de todas as famílias. Obrigado, mãe, por você me ajudar a ser quem eu sou”.

O objetivo desse artigo é mostrar como o apoio de uma mãe desde a infância pode ajudar o filho homossexual a vencer os preconceitos da sociedade. Segundo o psicoterapeuta alemão Bert Hellinger, criador das Constelações Familiares, a mãe é responsável pela nossa existência e tem que ser honrada. A mãe é quem nutriu seu filho desde o momento em que estava em seu útero, permitindo que o mesmo sobrevivesse no mundo exterior. Em suma, a mãe corresponde ao sucesso e, portanto, uma relação bem resolvida com a mãe será responsável pelo sucesso de seu filho.

Quando pensamos na situação de alguém que se descobre homossexual, a primeira batalha a ser vencida é dentro de sua própria família. E, nesse momento, o papel da mãe é fundamental. Ela tem que ser a primeira a acolher o seu filho e a lhe dar a bênção para ser feliz. E Dona Hermínia exerceu com bastante louvor o seu papel de mãe.

A próxima batalha a ser vencida será na sociedade. É triste o preconceito que os homossexuais sofrem no mundo afora. Esse preconceito ainda existe, mas com bastante motivação e resiliência, finalmente, muitos direitos estão sendo conquistados.

No mundo jurídico as principais conquistas dos homossexuais foram o direito ao casamento, à adoção de filhos e a criminalização da homofobia.

Primeiro, veio o reconhecimento da união estável homoafetiva pelo Supremo Tribunal Federal. Depois, o Superior Tribunal de Justiça passou a admitir a viabilidade da conversão da união estável em casamento também para os casais homossexuais. Em 2012, as corregedorias dos Tribunais Estaduais passaram a admitir esse tipo de casamento. Finalmente, em 2013 foi editada a Resolução 175 do Conselho Nacional de Justiça impedindo que os Cartórios de Registro Civil se neguem a celebrar casamentos homoafetivos.

A adoção de crianças e adolescentes por casais homossexuais somente passou a ser admitida pelo Superior Tribunal de Justiça a partir de 2010. Antes, a maioria dos juízes não permitia a adoção homoafetiva porque o casal homossexual não era considerado uma entidade familiar. O Supremo Tribunal Federal também passou a admitir a adoção por casais homoafetivos sempre em razão do melhor interesse da criança e do adolescente. Isso mostra como a família homoafetiva está sendo reconhecida pelo Direito de Família Brasileiro.

Por fim, a mais recente conquista foi a criminalização da homofobia pelo Supremo Tribunal Federal ocorrida em 13/06/2019. Como o legislativo está demorando muito para tratar do tema, o Supremo Tribunal Federal acabou legislando nesse caso. Dessa forma, a conduta homofóbica será punida com base na Lei do Racismo (7716/89), a qual prevê como crime a discriminação ou preconceito por raça, cor, etnia, religião e procedência nacional. Trata-se de um crime inafiançável e imprescritível, com pena de 1 a 5 anos de prisão ou multa, dependendo da gravidade do caso. Portanto, enquanto não for publicada uma lei criminalizando a homofobia, a mesma será tratada como um tipo de racismo.

Importante lembrar que o filme “Minha mãe é uma peça 3” foi criticado por não ter beijo gay na cena do casamento. Um dos atores ficou bastante chateado com tal crítica e disse o seguinte: “a gente não precisa esfregar nenhuma opinião pessoal na cara do público”.

Como se vê, o objetivo do filme não é chocar e, sim, tratar com muita naturalidade uma questão que está cada vez mais corriqueira na sociedade brasileira: o reconhecimento da família homoafetiva. Isso mostra a vitória de todos aqueles que lutaram pelo fim do preconceito. Resultado: filme campeão de vendas nas bilheterias brasileiras!

Debora Ghelman minha mãe
Debora Ghelman. Foto: Fred Busch

*Debora Ghelman é advogada especializada em Direito Humanizado nas áreas de Família e Sucessões, atuando na mediação de conflitos familiares a partir da Teoria dos Jogos.

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